
Falsa Política
28 de Setembro de 2023No mês passado, a propósito da forma ardilosa como o poder político local fabrica consensos com a dita sociedade civil, abordei um pouco do que se está a passar e o que se planeia para o Jardim da Parada.

● A questão fundamental continua a ser o impacto que a construção de uma estação do Metropolitano terá na preservação e integridade do jardim.
No entanto, a atenção mediática foi desviada. Também por contributo de um movimento que nada tem de orgânico nem de representativo da comunidade local, foi levantada a proposta de criação de um denominado ‘superquarteirão’, intenção que convergia plenamente com os planos da Câmara Municipal de Lisboa (CML) expressos no seu programa ‘Há vida no meu bairro’, apresentado em Março de 2023.
Para Benfica, como nesta coluna expus, a proposta que consta nesse programa seria fazer algo semelhante na Rua Grão Vasco. Por isso, importa olhar para o que vai sendo feito noutros pontos da cidade.
Neste momento, está então a ser materializada, durante cerca de uma semana, esta idealização do ‘superquarteirão’ no Jardim da Parada. As ruas envolventes deste espaço verde estão agora encerradas ao trânsito e ao estacionamento, e no lugar do asfalto estão agora mesas corridas com bancos que ocupam mais de metade da estrada, orladas com plantas em vasos, não faltando tapetes verdes a imitar relva.
O carácter artificial do mobiliário parece condizer bem com a artificialidade dos anunciados propósitos do evento. Há ainda roulotes de farturas e pequenas tendas para apoiar as actividades desportivas e de lazer programadas para esta semana. Colunas espalhadas na zona debitam música ao estilo (e volume) de uma festa popular.
Uma faixa da Junta de Freguesia de Campo de Ourique propagandeia que ‘há mais bairro no jardim’. Por curiosidade, observo que a maioria das pessoas que ali circulam continuam a usar o passeio (e não o novo espaço reclamado) para circular.
Extrapolando para o que aconteceu no princípio da Rua Cláudio Nunes, cuja estrada deu lugar a esplanadas, é mais fácil ver a captura do espaço público para benefício de privados (neste caso. o sector da restauração local), do que como suporte de um pretenso sentimento comunitário.
Ou seja, o uso do espaço retirado aos transportes obedece a uma simples lógica de consumo e entretenimento.
É possível ser brando com a Junta e a CML, assumindo que esta iniciativa tenha um carácter pontual, semelhante a tantas outras feiras e festas que se fazem pela cidade, embora se possa sempre assinalar o sentido de oportunidade de fazer tal coisa numa zona com uma malha urbana tão densa composta de ruas de sentido único e com tão pouco estacionamento.
Mas se assumirmos que tal medida se possa converter em definitiva, seria sinal de uma profunda falta de contacto com o lugar e com a realidade de quem vive e trabalha na zona por parte de quem tem o poder de decisão.
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