
Tráfego aéreo nocturno: moradores contestam decisão
30 de Outubro de 2022A Comissão de Moradores do Bairro Azul (CMBA) está contra a Portaria que revoga provisoriamente restrições legais ao tráfego aéreo nocturno em Lisboa, com eventual “aumento da exposição de ruído das populações dos concelhos de Lisboa e Loures” durante a noite. Já a Associação de Moradores da Praça de Entrecampos (AMPRE) não assumiu uma posição formal, mas segundo um dos seus membros, vários associados acolheram mal a medida, até porque o ruído provocado pelo tráfego aéreo é “um tema recorrente”.

● Paralelamente aos contestatários, existem residentes na freguesia, uma das mais afectadas da cidade pelo ruído do tráfego aéreo, resignados com a situação, ou porque se habituaram ao ruído dos aviões ou porque instalaram janelas reforçadas nas residências. Outros ainda desconhecem a revogação.
Medida contestada
Apesar da legislação agora aprovada ser temporária, prever medidas de mitigação da exposição da população a excessos de ruído e ter estado sujeita a consulta pública, foi desde o início alvo de críticas de organizações ambientalistas, designadamente a Associação Zero. Para esta entidade, a situação actual, já de si grave, sobretudo pelo impacto negativo na saúde da população e na aprendizagem das crianças de 6/7 anos, não pode ser agravada “sob nenhum pretexto durante nenhum período”. Uma alusão à alegada violação dos limites legais de voos nocturnos em vigor, já de si “extremamente generosos para a actividade aeroportuária e ao mesmo tempo extremamente lesivos do descanso dos cidadãos”.
A Zero argumenta que a Portaria é inconstitucional, sendo um passo para “uma expansão encapotada do aeroporto” (a que a associação se opõe) e foi sujeita a consulta pública apenas durante duas semanas no Verão e restrita a interessados com legitimidade comprovada. Para a associação, é prioritário e urgente aplicar “o Plano de Acções de Gestão e Redução de Ruído para o Aeroporto Humberto Delgado, aprovado pela Agência Portuguesa do Ambiente, e que é uma obrigação da legislação nacional e europeia, mas que não estão a ser aplicadas pela ANA Aeroportos”.
Partidos contestam
O PAN – Partido das Pessoas, Animais e da Natureza, também contestou a medida. No mesmo dia da publicação da Portaria, 17 de Outubro, apresentou um Projecto-Lei propondo a sua revogação imediata. Mas não só. Na mesma data, apresentou outro Projecto-Lei propondo a interdição de voos nocturnos em todos os aeroportos e aeródromos nacionais entre as 00h00 e as 06h00, salvo por motivos de força maior identificados na lei, bem como um requerimento nas comissões de Ambiente e Economia solicitando uma audição conjunta do Secretário de Estado do Ambiente e do Secretário de Estado das Infraestruturas para prestação de esclarecimentos sobre a Portaria e os alegados incumprimentos dos limites legais do ruído relatados pela Zero.
Entretanto, já em 13 de Setembro, o Grupo Municipal do Livre propusera uma recomendação à Assembleia Municipal de Lisboa, que foi aprovada, para que instasse a CML a manifestar-se “contra a derrogação temporária da Portaria n.º 303-A/2004 e contra o levantamento de restrição aos voos noturnos no aeroporto Humberto Delgado”. Exigia ainda “que os horários e as limitações definidos na Portaria n.º 303-A/2004 fossem respeitados”. Por último, solicita ao Governo que regulamente o período de restrição de voos para que esta seja total entre as 00h00 e as 06h00 e que nas horas adjacentes haja limitação ao número de voos.
Face a estas críticas, a presidente da NAV, que regula o tráfego aéreo em Portugal, esclareceu que a medida iria reduzir o número de voos sobre Lisboa na primeira semana de aplicação, que 168 voos é apenas um limite máximo (ver caixa) e que, embora a NAV seja sensível ao problema do ruído na cidade, “os aviões são o que são e o aeroporto está onde está”.f
O que diz a Portaria
● Em causa está a Portaria n.º 252-A/2022, de 17 de Outubro, prevista para vigorar entre 18 de Outubro e 22 de Novembro, publicada conjuntamente pela Secretaria de Estado do Ambiente e a Energia e a Secretaria de Estado das Infraestruturas por necessidade de mudança do sistema de gestão de tráfego aéreo. De acordo com esta legislação, “a operação de aeronaves no Aeroporto Humberto Delgado é permitida entre as 0h00 e as 2h00 e entre as 5h00 e as 6h00”, acrescentando que o actual sistema de gestão de tráfego aéreo “carece de uma actualização que permita à empresa responsável pelos serviços de navegação aérea em Portugal – a NAV Portugal – continuar a assegurar a plena segurança operacional e a melhorar a qualidade do serviço prestado, assegurando a correcta articulação com as suas congéneres da Suécia, Dinamarca, Irlanda, Áustria e Croácia, que operam um sistema comum de controlo de tráfego aéreo no âmbito da aliança de prestadores de serviços de navegação aérea designada como COOPANS”.
Segundo a Portaria, “por se encontrar em processo de migração do seu sistema de gestão de tráfego aéreo, a empresa responsável pelos serviços de navegação aérea em Portugal, obriga-se necessariamente, por razões de segurança operacional, a introduzir regulações ao tráfego aéreo, limitando a capacidade do número máximo de voos processados por hora e fazendo com que nem todos os movimentos aéreos possam ser realizados nas faixas horárias previamente atribuídas”.
Ainda segundo este documento, “não se trata de aumentar o número de movimentos aéreos diários já planeados, mas sim de permitir parte da sua redistribuição para o período noturno, de modo que as transportadoras que tenham a sua base operacional no Aeroporto Humberto Delgado possam realizar os night-stops planeados naquela infraestrutura, os últimos voos diurnos em período nocturno e antecipar os primeiros voos do dia, possibilitando a realização de movimentos aéreos fora das faixas horárias previamente atribuídas, por razões que não lhes são directamente imputáveis, evitando comprometer a operação e o planeamento subsequente de voos para os dias seguintes”.
Na primeira semana de vigência, entre 18 a 23 de Outubro, os voos nocturnos não podiam exceder 168, na segunda semana não podem ultrapassar 86 voos, na terceira 75, na quarta 45, na quinta 30 e na última semana 20.f






